quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Filme: Gravidade (2013)


A viagem ao Espaço de Gravidade é uma experiência fabulosa e deslumbrante que absorve e impressiona. Ímpar na ambição e na execução, pode muito bem ser a obra de referência de Alfonso Cuarón.

A missão espacial STS-157 encontra-se na recta final dos seus trabalhos de manutenção ao Telescópio Hubble. A STS-157 é a primeira viagem ao Espaço da estreante Dra. Ryan Stone (Sandra Bullock) e a última do veterano Matt Kowalski (George Clooney). Prestes a acabar o seu trabalho e a regressar a casa, a tripulação vê-se no meio de uma tempestade de atritos de satélites abatidos que arrisca a sobrevivência de toda a Missão.

Gravidade é uma experiência absorvente sem paralelo. Da primeira icónica cena crescente de um planeta Terra silencioso e tranquilo a uma última que é semelhante nos apanágios, embora numa índole diferente, Gravidade faz uso do seu poder gravitacional visual para manter a audiência suspensa aos alucinantes acontecimentos. O nível de detalhe é tão imenso e distinto que o tamanho da tela não parece capaz de conter toda a energia de uma câmara vigorosa e omnipresente. Gravidade, e não só por trâmite de uma aplicação a três dimensões admirável, extravasa as fronteiras da tela e puxa o espectador para os seus eventos. Muita desta sensação resulta da forma como Alfonso Cuarón, repleto de magia na sua execução, dá a ideia de que subiu ele próprio ao Espaço para filmar o seu ambicioso projecto. A física, mesmo que não infinitamente perfeita, apresenta-se criteriosamente cumprida; Alfonso Cuarón entrega aquilo que promete na premissa da sua história (obediência total à ausência de oxigénio, de pressão de ar e de som no Espaço).

A precisão e a clareza visual da Terra, do Espaço e das plataformas espaciais são impressionantes. Aliadas a uma banda sonora experimental e docemente desconcertante, Gravidade produz momentos de ansiedade capazes de fazer suster a respiração. Curiosamente, num meio tão vasto quanto aquele onde os tripulantes da Missão STS-157 se encontram, a impressão que ressalta é uma de imensa claustrofobia. O tratamento psicológico de que estes tripulantes são alvo desperta desconforto e preocupação. Basta atentar à sua respiração ofegante e esforçada para depreender o seu estado de espírito alarmado e desnorteado. No meio do atordoamento visual e sonoro, Gravidade encontra espaço para desenvolver o lado sensível destas personagens, em particular o da Dra. Ryan Stone, em quem deposita a esperança de uma ligação emotiva com a audiência – ligação que funciona impecavelmente e permite desculpar alguns ociosos automatismos.

A narrativa de Gravidade é simples e precisa, não cobiçando interpretações morais ou facciosas. É a mera história de uma tripulação em missão espacial na órbita da Terra que sofre uma terrível contrariedade e faz o necessário para sobreviver. Se Gravidade apresenta alguma notória falha é nesta natureza tão simplista que, sem outros atributos ou instrumentos de narrativa, vive de uma expressividade excessiva da Lei de Murphy. Todavia, numa experiência tão arrebatadora como esta, a narrativa é menos relevante e o veículo visual mais representativo. Nesta particularidade, Gravidade suplanta qualquer expectativa e estabelece um novo sustentáculo de comparabilidade. O espectador sai desta experiência assombrado e estonteado como se, tendo acompanhado a subida e a estada de Alfonso Cuarón no Espaço, tivesse abruptamente caído na atmosfera terrestre (e, neste caso, na apercepção cinematográfica do acontecimento).

Não obstante o peso visual, Sandra Bullock tem a importante tarefa de tornar a Dra. Ryan Stone apelativa e relacionável. Bullock consegue-o com relativo pouco esforço, ressalvando as fragilidades emocionais da sua personagem no meio do caos espacial. George Clooney não tem muito tempo de ecrã, nem nunca se lhe exige demasiado, mas marca cada cena com o seu discursar brando e reconfortante. A fotografia de Emmanuel Lubezki é globalmente brilhante e inclui momentos de verdadeira sublimidade. O uso da capacidade de aprofundamento espacial do 3D é raramente tão consistente e absorvente como este. Alfonso Cuarón tem possivelmente em Gravidade o seu melhor trabalho; é certamente o seu melhor trabalho visual. O tempo dirá da capacidade de permanência de Gravidade, mas este pode muito bem ser um dos melhores filmes espaciais, senão o melhor. É, incontornavelmente, o mais fidedigno, o mais extraordinário e o mais próximo que cada um pode almejar ficar da experiência extraterrena.   

CLASSIFICAÇÃO: 4,5 em 5 estrelas


Trailer:

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