sexta-feira, 20 de julho de 2012

Filme: Ted (2012)


Ted abrange momentos de incrível humor, mas fica aquém quando a sua personagem principal (que, afinal, nem humana é) se encontra fora de cena ou quando o argumento abandona a comédia em favor de dramas desinteressantes. Seth MacFarlane demonstra habilidade atrás da câmara, mas o seu maior sucesso em Ted é Ted ele próprio – mal-educado, grosseiro e hilariante, tal e qual como tantas outras personagens que MacFarlane criou para o pequeno ecrã.

No natal de 1985, John Bennett (Mark Wahlberg), um menino solitário e triste, recebe um boneco de peluche como prenda. Completamente afeiçoado ao peluche Ted (Seth MacFarlane), John deseja que ele seja capaz de falar e que possam ser amigos de verdade. E o desejo de John concretiza-se. Mas conforme os anos passam e as responsabilidades aumentam, a relação entre John e Ted complica-se, sobretudo com o impacto progressivo de Lori Collins (Mila Kunis) na vida de John.     

MacFarlane nunca desistiu de deixar claro nas suas séries de animação a sua inclinação para o humor negro, chocante e provocador, para as inúmeras referências culturais, ou a sua aversão aos meios religiosos. MacFarlane recicla toda a sua bagagem e reutiliza-a em Ted, maioritariamente de modo divertido, aqui e ali de forma forçada. A comédia é mesmo a sua maior qualidade e a personagem Ted é tão marcante como, por exemplo, Peter Griffin em Family Guy (aliás, com quem parece mesmo partilhar a voz). No entanto, quando MacFarlane se arrisca em campos dramáticos, no argumento escrito por ele mesmo, fica bem patente a sua dificuldade em lidar descontraidamente com o género, mesmo que Wahlberg e Kunis (particularmente esta) dêem o seu melhor para disfarçar o constrangimento envolvente.

Não é normal ver Wahlberg neste género de filmes e a sua escolha foi arriscada. Mas no final a aposta é ganha por Wahlberg – John consegue ser a espaços tão divertido quanto Ted, quanto não seja pela infantilidade de um homem de 35 anos que não consegue deixar o seu ursinho de peluche (sendo Ted como é, quem conseguiria?). Ted inclui ainda um conjunto inesperado de cameos, com o grande destaque a ir para Norah Jones numa presença incrivelmente descontraída e mesmo corajosa.

Ted apresenta uma premissa anormal, para não dizer irrisória. Mas rapidamente conquista o público com o carácter tão intrinsecamente humanizado do urso de peluche. Apenas por ele vale a pena o visionamento do filme, sobrepondo-se a sua incontornável presença e o seu forte carisma aos clichés que tapam assim-assim alguns dos buracos do argumento. O enredo principal toma muito tempo a clarificar-se e a edição é algo convulsionada, mas quando Ted é engraçado, é mesmo engraçado.   

CLASSIFICAÇÃO: 3 em 5 estrelas


Trailer:




sexta-feira, 6 de julho de 2012

Filme: O Fantástico Homem-Aranha (2012)



O Fantástico Homem-Aranha nunca é um filme aborrecido. Intercala-se com momentos de humor, momentos de acção e momentos de reflexão. A aposta neste reboot tão prematuro poderia redundar-se num falhanço crasso, mas O Fantástico Homem-Aranha consegue superar a problemática da familiaridade do enredo e sustentar-se a si mesmo como um reinício válido.

Peter Parker (Andrew Garfield) é um dos muitos adolescentes na sua escola. Invisível e geeky, Peter repudia os actos de bullying e desafia os transgressores. Assombrado pela morte prematura dos seus pais, Peter decide averiguar os factos que envolveram o acidente que os vitimou. A sua investigação leva-o à OsCorp, uma empresa especializada em avanços científicos e tecnológicos que empregava o seu pai. Ali encontra-se com o Dr. Curt Connors (Rhys Ifans), antigo colega do seu pai que pode saber alguns dos segredos do projecto em que ele trabalhava. Peter decide ir mais longe na sua investigação e descobre o laboratório na OsCorp onde se encontra o antigo projecto do seu pai. Mas algo corre mal e Peter sofre uma transformação que o leva a envergar a máscara do Homem-Aranha e que o aproxima da sua paixão, Gwen Stacy (Emma Stone).

Possivelmente inspirado pelo que Christopher Nolan fez com Batman, Marc Webb entrega a oO Fantástico Homem-Aranha um tom mais sombrio e misterioso. É um projecto mais psicológico, e também mais ambicioso, que a trilogia original de Sam Raimi. E a indicação de que a transformação de Peter pode estar directamente relacionada com o trabalho do seu pai do que a mera coincidência da “hora certa no local certo” proposta por Raimi confere a este reboot uma mão mais refinada de questões éticas. Aliás, uma das temáticas mais frequentes neste novo filme é a perfeição humana e o limite da investigação e aplicação científica. E tal como na trilogia original, encontram-se também presentes as temáticas do heroísmo e da vendeta – nem sempre sendo fácil desmarcar uma da outra.  

Andrew Garfield encaixa melhor no papel de Peter Parker/Homem-Aranha que Tobey Maguire. O seu Peter Parker é mais destemido e inteligente (confrontando os transgressores mesmo antes da sua transformação) e o seu Homem-Aranha parece mais ágil e astuto. A química entre Garfield e Emma Stone é também melhor que a de Maguire e Kirsten Dunst – é sobretudo superior pela decisão de tornar a personagem de Stone consciente da identidade secreta de Peter, que encaminha a diálogos bem construídos entre as duas personagens sobre os limites do Homem-Aranha. No fim, Peter é só um miúdo.

Mas o Fantástico Homem-Aranha não está isento de falhas. A familiaridade do enredo é o grande fantasma que assombra. É certo que muito não pode ser alterado de uma fonte que é comum aos dois trabalhos (de Raimi e Webb), mas o argumento peca por ser malandro. Certos meios empregues (e reciclados) são desnecessários, em particular a morte do tio de Peter Parker a funcionar como catalisador para a emergência do Homem-Aranha – parecia evidente que a investigação sobre a morte dos pais de Peter bastaria; ou as vozes que o Dr. Curt Connors ouve do seu alter-ego negro, à la Dr. Norman Osborn no primeiro filme de Raimi.

Tecnicamente, o Fantástico Homem-Aranha é quase brilhante – a única falha é o CGI menos bem conseguido do Lagarto, que a momentos é tão claramente computorizado que o espectador se pensa num filme de animação. Uma cena na Williamsburg Bridge é absolutamente incrível e os momentos finais na torre da OsCorp são de cortar a respiração. A música de James Horner, embora sem um tema icónico como a de Danny Elfman, contribui para aumentar a tensão, ou aliviá-la, nos momentos-chave.

O Fantástico Homem-Aranha promete ir às origens e mostrar uma história do Homem-Aranha nunca dantes contada. Em parte é verdade, em parte é mentira. Mas vale a pena ficar 136min a distinguir o que é novo do que não é e maravilhar-se com um excelente elenco muito mais à vontade nos seus papéis e com um realizador que utiliza todas as técnicas de ponta para proporcionar momentos de abrir o olho. E se o Fantástico Homem-Aranha está para Webb como Batman – O Início está para Nolan, então talvez o segundo empreendimento de Webb, já solto do constrangimento da familiaridade da transformação de Peter Parker, seja verdadeiramente fantástico.

CLASSIFICAÇÃO: 3,5 em 5 estrelas


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