terça-feira, 30 de abril de 2013

Filme: Evil Dead - A Noite dos Mortos-Vivos (2013)


O remake Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos é um filme de horror que consegue efectivamente cumprir o seu propósito, mesmo com a sua propensão alta para reciclar técnicas já muito estabelecidas e conhecidas.   

Mia (Jane Levy) é viciada em drogas. Após falhar no passado uma tentativa de desintoxicação, e ter estado no seguimento à beira da morte, Mia decide tentar novamente a sua reabilitação. Desta vez, Mia reúne os seus amigos numa antiga cabana no meio dos bosques com a promessa de levar o difícil processo até ao fim. Mas quando forças diabólicas evocadas por um misterioso livro entram em acção, a abstinência de Mia revela-se mais complicada do que o previsto e a ressaca insuportável.

Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos, enquanto remake do original de 1981 de Sam Raimi (que agora assiste como produtor), não faz muito para estabelecer a sua originalidade e evitar convencionalismos, aceitando, aliás, a inexistência do primeiro e a inevitabilidade do segundo como necessários pecados do seu modus operandi. Há novamente portas que batem repentinamente, há novamente um grupo de adolescentes-tipo, há novamente uma cabana isolada com uma cave escondida. O triunfo do realizador Fede Álvarez reside na habilidade de empregar correctamente todos os apetrechos à disposição (como a luz, a montagem, o som e a música) para reintroduzir o horror nas sequências prenunciadas de uma forma palpitante, usando mesmo a capacidade de previsão do espectador como um elemento do seu processo de criação de medo e mal-estar. Acrescem momentos absolutamente imprevistos, pontuados pela sanguinolência, que provocam o arrepio, o desconforto e a sensação claustrofóbica de não querer ver mas não resistir a espreitar.

Mas como a maioria dos remakes que se tenciona a adaptar o original às novas técnicas e ilusões cinematográficas, Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos prevarica na estilização e eventualmente deixa completamente de lado a premissa que envolve as suas personagens. É um abandono lamentável e evitável; a história do abuso de drogas e da vontade de reabilitação de Mia, bem como o histórico mental da sua família, poderia ter introduzir outro nível de horror: o horror psicológico. Se tivesse trabalhado esse aspecto, talvez Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos não forçasse tanto que personagens a certo ponto tão fisicamente debilitadas aparecessem in extremis para resolver uma complicada situação.

O uruguaio Fede Álvarez, na sua primeira longa-metragem, mostra ter pulso para o cinema de horror, embora careça a noção de que a sugestão de horror assusta até mais do que a visualização de todo o horror. Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos é opulento na característica visual e, na sua brutalidade em escala e na sua reclusão à penumbra e ao escarlate intenso, não está para o espectador mais facilmente impressionável, tal como também não está para o espectador desabituado ou que desaprecia o género cinematográfico. O restante espectador, e em particular o espectador admirador do género, ficará satisfeito com o resultado final e abundará nos arrepios e nas risadas nervosas. Com a possibilidade de uma sequela em aberto, é caso para dizer que Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos é uma ressaca dos diabos.      

CLASSIFICAÇÃO: 3 em 5 estrelas


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sexta-feira, 26 de abril de 2013

Filme: Homem de Ferro 3 (2013)


Homem de Ferro 3 nunca se liberta totalmente dos constrangimentos de pertencer a um universo alargado coabitado por outros super-heróis, mas faz o suficiente para agradar fãs com o habitual humor compenetrado e com elaboradas sequências de acção.  

Depois dos eventos de Nova Iorque que reuniram pela primeira vez o grupo de super-heróis conhecidos como os Vingadores, Tony Stark (Robert Downey Jr.) enfrenta um conflito interno que condiciona o seu trabalho e a qualidade das suas relações. Quando a proliferação dos atentados do terrorista conhecido como Mandarim (Bem Kingsley) põe em risco a vida de alguém próximo de Stark, o Homem de Ferro é chamado à acção.  

Homem de Ferro 3 surge numa altura em que a implantação do universo Marvel já atingiu a sua máxima expressão e em que outra fase começa a desenvolver-se. Os constrangimentos de reintroduzir Tony Stark num quadro reduzido em que apenas o seu heroísmo faz sentido são notórios e multiplicam-se as referências aos acontecimentos finais de Os Vingadores na tentativa de estabelecer uma ponte lógica entre os eventos. A ligação toma forma em crises de ansiedade, numa aparência de stress pós-traumático, que invadem e perturbam Stark, retirando-lhe a habitual arrogância e carisma que constituíam epítetos do seu carácter nos dois primeiros filmes. Este Stark pós-Vingadores encontra-se mais distante, isolado, fechado no seu equipadíssimo laboratório em volta de novas criações e de novos fatos de combate, aguardando outra grande ameaça que coloque o mundo em perigo. A ameaça que assoma é, no entanto, antiga, anterior à própria criação do Homem de Ferro, e marcada por um cunho pessoal, por um tradicional ajuste de contas. É, quiçá, nesta individualização do desafio de Stark que a ausência de outras personagens do universo da Marvel faz sentido; mas a sua completa inexistência ou falta de menção ao longo do filme, bem como a aparente tranquilidade relativamente à relevação passada de poderosos inimigos alienígenas, constitui sempre um constrangimento. Será que o mundo regressaria efectivamente à normalidade depois de tão inopinada – e destrutiva – revelação?

Homem de Ferro 3, no seu processo de reintrodução, regressa também à permanente ameaça terrorista que paira sobre os Estados Unidos. O Mandarim de Ben Kinglsey apresenta-se como uma fusão de conhecidos terroristas, disseminando uma mensagem violenta com palavras duras. A sua presença, marcada por uma voz atemorizadora, faz-se sentir na difusão televisiva das suas acusações e dos seus misteriosos atentados – o suficiente para que rapidamente se torne no inimigo nº 1 da América. Contudo, Mandarim não é quem parece. A surpreendente revelação tanto origina entusiasmo como defrauda um pouco. Resulta numa tarefa mais coerente para Stark à luz do seu passado, mas condiciona o potencial do argumento e a ameaça psicológica deixa de ter a desejada expressão.

O trabalho de Robert Downey Jr. é muito mais físico neste terceiro filme. Isolado e reduzido nas suas alternativas, após a néscia decisão que resulta na completa destruição da sua casa, Tony Stark humaniza-se, é mais terra-a-terra, compreendendo que é o homem quem faz o fato e não o fato quem faz o homem. O isolamento e os problemas de ansiedade proporcionam a Downey Jr. uma acrescida bagagem emocional. Infelizmente, a direcção de Shane Black perde bravura perante tais conflitos do foro interno, nunca procurando verdadeiramente a sua eficiente resolução; sempre que possível, troca-os por mais acção de encher o olho. O trabalho de Gwyneth Paltrow é também acrescido: a sua Pepper Potts é menos cândida e contemplativa que anteriormente, tomando uma parte significativa no desenrolar e no desfecho dos eventos. A introdução de Guy Pearce como Aldrich Killian é importante, ainda que um tanto convencional na dimensão dos seus predicados.

Durante pouco mais de duas horas, Homem de Ferro 3 insiste em viver à conta das suas impressionantes cenas de acção, mesmo que o seu argumento pretenda vender questões da condição humana. O entretenimento encontra-se assegurado para o espectador que procura a maravilha técnica, mas não é garantido para aquele que, ao terceiro esforço, procura algo mais amadurecido. O futuro do Homem de Ferro fica em aberto, mas a ideia de fim de ciclo parece óbvia no final. É quase necessária.

CLASSIFICAÇÃO: 3 em 5 estrelas


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quarta-feira, 17 de abril de 2013

Filme: Nome de Código : Paulette (2013)


Com diálogos humorísticos e arrojados, Nome de Código: Paulette é uma comédia leve que, sob a despretensão do seu cariz de entretimento, transporta mensagens válidas sobre a sociedade e os efeitos da crise. Lafont encontra-se fantástica.

Paulette (Bernadette Lafont) é uma idosa que acaba de cumprir dez anos de viuvez. Pobre, incapaz de se resignar com uma sociedade em crise com a qual não se identifica e mal-encarada pela família, decide traficar drogas no seu bairro. O negócio de Paulette cresce inesperadamente e transforma-se. Mas a nova vida, rodeada de perigos, obriga-a a uma reflexão sobre o seu comportamento, as suas amizades e a sua família.

Nome de Código: Paulette é uma comédia interessante e divertida, mas que só ganha dimensão e importância sempre que se decide a trocar a mera diversão pelo drama sincero que alude aos efeitos da crise e da globalização. Paulette, embora fisicamente engraçada e vocalmente cómica, é, na realidade, uma idosa inconformada com a nova sociedade e com as novas gerações. Despretensiosamente xenófoba, intrinsecamente inconformada e inevitavelmente arrogante, Paulette coloca as culpas da sua pobreza e da expropriação e penhora das suas propriedades naqueles que ignorou a vida toda e que, fruto dos tempos, se posicionaram mais fortemente na sociedade. É inevitável que a ironia se apresente a certo ponto no enredo e que Paulette recorra precisamente a indivíduos que tanto menosprezou para dar a volta à sua pobreza e aos sarilhos em que se enfia.

Paulette não é, porquanto, uma personagem moralmente correcta. Longe disso. É mal-educada, desrespeitadora e racista. O seu acto imoral vai ainda mais longe quando decide vender drogas para se rodear de mordomices, que vão além das necessidades básicas de sobrevivência. Mas é na sua imoralidade que Paulette acaba por, carinhosa e divertidamente, se reencontrar com o seu bom rumo e com a sua esperada redenção. Pelo caminho, torna-se uma traficante de respeito, até de recear, e constrói um negócio de pastelaria com substâncias ilícitas de sucesso. Se tudo servisse de pretexto para uma boa piada, o filme pouco proveito teria. Felizmente, mesmo que se renda a determinados convencionalismos inevitavelmente aborrecidos, é capaz de se tornar terno e decoroso e de tornar uma velha resmungona numa senhora que, no fundo, apenas nunca soube como lidar com a diferença e com a família.

Bernadette Lafont é uma actriz com uma presença cómica deliciosa, mas vende completamente o seu papel com a inteligência dramática omnipresente até nas cenas mais vulgares em que o espectador provavelmente desvia o olhar e se desconcentra. Ajuda Lafont que o diálogo seja afoito e provocador e que o argumento lhe dê, apesar de todas as contradições imorais, a dimensão de improvável heroína. O elenco de suporte tem a espaços o seu bom momento, mas nenhum chama mais a atenção, depois de Lafont, do que Françoise Bertin, interpretando uma bem-disposta, embora sempre ausente e desorientada, doente de Alzheimer.

A realização de Jérôme Enrico não engrandece e peca pouco. Exagera em estereótipos, particularmente no tratamento dos traficantes e dos maus-da-fita, e abunda em irrealismos, mas talvez parte da magia e da relativa inocência do filme resida precisamente nesses instrumentos. Nome de Código: Paulette, acompanhado por uma banda sonora deliciosa, é, assim, uma boa comédia e um melhor drama, quando o há. E sendo capaz de tornar a terceira idade numa nova e divertida fase de vida, apresenta-se com valor.

CLASSIFICAÇÃO: 3,5 em 5 valores


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sexta-feira, 12 de abril de 2013

Filme: Esquecido (2013)


Esquecido é um filme de ficção científica decente, com uma linha de narrativa que se revela lentamente, à medida dos seus panoramas pós-apocalípticos. É menos inteligente do que a atmosfera sóbria pretende passar, e ainda menos exigente.

Jack (Tom Cruise) é o mecânico de drones do sector 49, um dos que ficou para trás num planeta Terra destruído por uma avassaladora guerra com uma força alienígena sessenta anos antes. A cerca de duas semanas de se juntar ao resto do seu povo no satélite Titã, Jack executa uma arriscada missão que coloca em risco todo o seu trabalho e até tudo aquilo em que acredita.

A história de Esquecido, resultante de um trabalho prévio, não publicado, do realizador Joseph Kosinski, começa de forma rotineira, prototípica, estabelecendo as regras e as origens do desfigurado mundo que se abre em planos extensos ao espectador. A deformação do planeta Terra, em apenas sessenta anos, é de tal modo avassaladora que o mecânico de drones Jack divaga, entre sobressaltos de pouca monta, pelos vestígios de emblemáticas estruturas que outrora tornavam Nova Iorque num símbolo do mundo moderno. Kosinski revela-se incapaz de resistir à força visual do pós-apocalíptico, ultrapassando necessidades de enquadramento geográfico em claros traços Emmerichianos. Por mais interessante e visualmente impressionante que seja, o exercício turístico de reconhecer famosas estruturas nova-iorquinas esgota-se rapidamente.

A narrativa de Esquecido, que sofreu um tratamento final por Michael Arndt, abrange expedientes de ficção científica que já não são propriamente originais. Possivelmente por essa razão, Esquecido delonga-se deliberadamente durante a primeira metade, conservando os seus principais trunfos para a segunda. A primeira metade é essencialmente expositiva, humorada, saltando entre momentos que sugerem uma reflexão superficial à humanidade e à resistência da sua alma e momentos de acção maioritariamente suportados no que de espectacular a nave em forma de libelinha consegue produzir. O retardar intencional provoca a paciência do espectador, não ajudando que ao lado de Jack apareça uma Victoria essencialmente genérica e monocórdica.     

A segunda metade destapa, enfim, o enigma. A imaginação por detrás de Esquecido, exibida finalmente nas suas forças e fraquezas, desilude um pouco, faltando-lhe uma pitada de inovação e de evolução temática. Felizmente, a abordagem de Kosinski à segunda metade melhora consideravelmente e os elementos cinematográficos alinham-se na medida certa: a banda sonora liberta-se da amarra electrónica a imitar Hans Zimmer e a fotografia do recentemente galardoado Claudio Miranda nivela-se na balança, entre o sépia do passado e o azul-acinzentado do presente. O último acto é estimulante, particularmente para os amantes de ficção científica, cujos se verão embrenhados em ramos de possibilidades.

 As interpretações em Esquecido não são, ironicamente, memoráveis. Tom Cruise nunca demonstra a carga psicológica que Jack, em conflito interno e de identidade, deve estar a sentir. Andrea Riseborough cria uma Victoria aborrecida. Morgan Freeman tem um papel relativamente curto e insignificante – a sua presença deve ficar a dever-se à necessidade de incluir outro conceituado nome no elenco. Olga Kurylenko, dos quatro, apresenta-se melhor, mas as circunstâncias a envolver a sua personagem são também as mais cativantes.

Esquecido rodeia-se de momentos vulgares. A originalidade não abunda tanto quanto pretende. Nem mesmo a imagem incisiva de uma Lua fragmentada impressiona – não é novo e já enchia o olho em A Máquina do Tempo. Esquecido melhora consideravelmente conforme avança para o seu último acto. Nele, redime-se o suficiente para não tornar tudo completamente esquecível.

CLASSIFICAÇÃO: 3 em 5 estrelas


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quarta-feira, 3 de abril de 2013

Filme: Conspiração Explosiva (2013)


Conspiração Explosiva torna-se rapidamente numa visualização fatigante, prologando excessivamente a intriga, tornando a vontade de a ver resolvida numa tarefa incómoda. Não abusando da acção, concede-lhe importância em demasia, ignorando as pertinentes temáticas sociais e políticas.  
   
Max Lewinsky (James McAvoy) é um detective em Londres. Uma noite, Max tenta impedir um roubo e capturar um dos principais bandidos, Jacob Sternwood (Mark Strong). Jacob consegue escapar, deixando Max ferido para trás. Três anos depois, Max ainda sofre as consequências do tiro de Jacob no seu joelho. Quando Jacob sai das sombras para encontrar os culpados por detrás da morte do seu filho, Max terá uma nova oportunidade para capturá-lo e ajustar contas.

Conspiração Explosiva dá a sensação de começar in medias res. Justamente, o filme começa em plena acção, em pleno prólogo, criando logo de início mazelas físicas e emocionais, identificando um conflito pessoal no qual procura alicerçar todo o resto do seu projecto. Todavia, a sensação de começo a meio das coisas não se esgota no pequeno prólogo, evidenciando-se, na verdade, ao longo da história. Embora um estratagema com os seus proveitos, transforma-se em Conspiração Explosiva num grave problema de continuidade, afectando o seu elemento cativante – o mistério. Durante a primeira metade, o mistério e o ar carregado interrogam o espectador, deixando-o deliberadamente perdido no labirinto de eventos; mas quando o desgaste é prolongado além do permissível, as revelações chegam demasiado tarde e sem importância. 

É lamentável que a opção do realizador Eran Creevy seja a de manter o espectador na ignorância até ao acto final. As temáticas que a sua história afinal trata são relevantes, actuais e interessantes. Creevy pretere-as, no entanto, à acção bruta, estilizada e maioritariamente sem sentido, arrastando-se em planos de câmara lenta que arrancam um improvável riso. O mau desenvolvimento das personagens e do seu carácter, bem como a péssima exposição das suas prioridades e das suas motivações, agravam o entendimento da narrativa.

O único ponto em Creevy se esmera é na maneira como captura a sobriedade de Londres, a implacidez das suas paisagens metropolitanas, o temperamento do seu tempo e das suas pessoas. No entanto, é apenas uma técnica meramente expositiva, que não coloca ou retira níveis de suspense. Tal trabalho fica a cargo da banda sonora; no entanto, parece tão perdida quanto espectador, excessivamente melodramática para a ocasião cinematográfica. O elenco é composto por bons nomes, de qualidades provadas, mas raramente ultrapassa a exigência dos requisitos mínimos. James McAvoy e Mark Strong mostram vontade em ir além da rigidez do argumento, o primeiro com expressões carregadas e mortificadas, o segundo com intensidade e amargura. Infelizmente, Creevy não permite espaço ao individual e íntimo.

Conspiração Explosiva é um filme que sucumbe à cobiça pela acção e à ineptidão em reconhecer as particularidades do indivíduo e da história. Se a infundamentada cisma para prolongar o mistério até ao fim tivesse sido resolvida de outra forma, outros caminhos, mais ponderativos e cativantes, ter-se-iam certamente apresentado. Como está, Conspiração Explosiva é um trabalho que começa in medias res e se fica in medias res.

CLASSIFICAÇÃO: 2 em 5 estrelas


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