Ancorado em duas brilhantes actuações de
Phoenix e Hoffman, The Master – O Mentor
vai muito para além da censura ao culto para colocar em primeiro plano a
dificuldade humana de relacionamento e de cura mental.
Freddie Quell (Joaquin Phoenix) é um
veterano da Marinha que cumpriu serviço durante a Segunda Guerra Mundial.
Afectado por transtorno de stress pós-traumático e com dificuldades de ajustamento
à sociedade pós-guerra, Freddie salta entre empregos, lugares e pessoas durante
cinco anos até eventualmente se cruzar, num barco em que entra clandestinamente,
com Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), fundador de um movimento
filosófico chamado “A Causa”. Dodd sente uma qualquer inspiração vinda de
Freddie e introduz-lho o seu grupo e propõe-se a ajudá-lo.
The Master – O Mentor é, à primeira
vista, uma análise ao culto e ao fenómeno da crença e do poder da doutrina. Paul
Thomas Anderson terá baseado “A Causa” na Cientologia, com o mentor
interpretado por Hoffman a representar L. Ron Hubbard – o fundador –, os seus
métodos, as suas alegadas formações académicas e o seu percurso. A comparação é
ainda mais óbvia considerando a época da narrativa – os anos 50 –, em que os
traumas e as feridas pós-guerra fomentaram o crescimento de novos movimentos e filosofias.
O método do “processing” que Dodd
emprega em Freddie, questionando-o agressivamente para aliviar traumas
passados, é uma clara representação do método da dianética proposto por Hubbard,
bem como a crença numa alma imortal que já ocupou vários receptáculos. Mas as
comparações, e a importância do movimento para o argumento, acabam aí.
“A Causa”, ou
a Cientologia, seja como for, é apenas um recurso aplicado na tentativa de terapêutica
de um alcoólico com dificuldades de relacionamento, de comportamento errático,
imprevisível, obcecado por sexo, arruinado por uma qualquer, não completamente revelada,
violenta experiência passada: Freddie. Incapaz de manter um emprego depois de
regressar da guerra, Freddie acumula incidentes e inimigos, até que o acaso, e
também o arrojo, o colocam no mesmo barco de Dodd. Freddie sente-se integrado
no grupo de Dodd como nunca antes fora noutro grupo e excede-se na sua gratidão
com actos violentos contra os detractores da “Causa”. Inspirado por algo em
Freddie, Dodd dá continuidade ao seu trabalho, enquanto aplica as suas
metodologias para expor e tratar as dificuldades de Freddie. Mas quando os problemas
estão enraizados e encobertos como no caso de Freddie, a cura só é possível com
empenho próprio e sincera vontade de mudança. Nesse sentido, Dodd serve de
mentor a Freddie, mas é a sua própria instabilidade e coerência, enquanto líder
e doutrinador, que coloca a recuperação dele em causa.
O Mentor dificilmente sobressairia sem
as actuações e a interacção entre Phoenix e Hoffman. O desempenho de cada um
dos actores é magistral e inspirador, particularmente nas sequências em que
partilham o ecrã. Amy Adams também se apresenta em grande nível. Paul Thomas
Anderson consegue colher sempre grandes interpretações do seu elenco, mas a sua
habilidade não é ao acaso. Tal como é perceptível com Daniel Day-Lewis em Haverá Sangue, n’O Mentor Phoenix e
Hoffman encontram-se relativamente à solta, improvisando à medida e exagerando
à vontade. Anderson deixa-os criar o seu espaço, limitando-se a gravar as suas representações
como um espectador maravilhado, sem grandes movimentos de câmara, como alguém
que não consegue tirar o olhar de cima. Depois, nos momentos certos, tal como
numa cena em que Freddie e Dodd conduzem uma moto no deserto, abre-se em
grandes e irrepreensíveis planos, metódicos, que abrem espaço à reflexão do espectador.
O Mentor, pautado por admiráveis
momentos, e por uma banda sonora frenética, é, sobretudo, a história de uma
jornada de auto-descoberta, de cura e de libertação, mesmo que eventualmente
nenhuma das três se concretize plenamente ou da forma esperada. Possivelmente,
é igualmente uma censura à Cientologia, mas tal perde importância quando são
valores e expectativas humanas que alicerçam o argumento. O Mentor encontra-se nomeado para três Óscares® pelos desempenhos
de Phoenix, Hoffman e Adams.
CLASSIFICAÇÃO: 4 em 5 estrelas
Site Oficial: http://www.themasterfilm.com/
Trailer:
já estava de olho neste filme; tenho de ver em breve. bom apontamento.
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