quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Filme: The Master - O Mentor (2013)


Ancorado em duas brilhantes actuações de Phoenix e Hoffman, The Master – O Mentor vai muito para além da censura ao culto para colocar em primeiro plano a dificuldade humana de relacionamento e de cura mental.

Freddie Quell (Joaquin Phoenix) é um veterano da Marinha que cumpriu serviço durante a Segunda Guerra Mundial. Afectado por transtorno de stress pós-traumático e com dificuldades de ajustamento à sociedade pós-guerra, Freddie salta entre empregos, lugares e pessoas durante cinco anos até eventualmente se cruzar, num barco em que entra clandestinamente, com Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), fundador de um movimento filosófico chamado “A Causa”. Dodd sente uma qualquer inspiração vinda de Freddie e introduz-lho o seu grupo e propõe-se a ajudá-lo.

The Master – O Mentor é, à primeira vista, uma análise ao culto e ao fenómeno da crença e do poder da doutrina. Paul Thomas Anderson terá baseado “A Causa” na Cientologia, com o mentor interpretado por Hoffman a representar L. Ron Hubbard – o fundador –, os seus métodos, as suas alegadas formações académicas e o seu percurso. A comparação é ainda mais óbvia considerando a época da narrativa – os anos 50 –, em que os traumas e as feridas pós-guerra fomentaram o crescimento de novos movimentos e filosofias. O método do “processing” que Dodd emprega em Freddie, questionando-o agressivamente para aliviar traumas passados, é uma clara representação do método da dianética proposto por Hubbard, bem como a crença numa alma imortal que já ocupou vários receptáculos. Mas as comparações, e a importância do movimento para o argumento, acabam aí.

“A Causa”, ou a Cientologia, seja como for, é apenas um recurso aplicado na tentativa de terapêutica de um alcoólico com dificuldades de relacionamento, de comportamento errático, imprevisível, obcecado por sexo, arruinado por uma qualquer, não completamente revelada, violenta experiência passada: Freddie. Incapaz de manter um emprego depois de regressar da guerra, Freddie acumula incidentes e inimigos, até que o acaso, e também o arrojo, o colocam no mesmo barco de Dodd. Freddie sente-se integrado no grupo de Dodd como nunca antes fora noutro grupo e excede-se na sua gratidão com actos violentos contra os detractores da “Causa”. Inspirado por algo em Freddie, Dodd dá continuidade ao seu trabalho, enquanto aplica as suas metodologias para expor e tratar as dificuldades de Freddie. Mas quando os problemas estão enraizados e encobertos como no caso de Freddie, a cura só é possível com empenho próprio e sincera vontade de mudança. Nesse sentido, Dodd serve de mentor a Freddie, mas é a sua própria instabilidade e coerência, enquanto líder e doutrinador, que coloca a recuperação dele em causa.     

O Mentor dificilmente sobressairia sem as actuações e a interacção entre Phoenix e Hoffman. O desempenho de cada um dos actores é magistral e inspirador, particularmente nas sequências em que partilham o ecrã. Amy Adams também se apresenta em grande nível. Paul Thomas Anderson consegue colher sempre grandes interpretações do seu elenco, mas a sua habilidade não é ao acaso. Tal como é perceptível com Daniel Day-Lewis em Haverá Sangue, n’O Mentor Phoenix e Hoffman encontram-se relativamente à solta, improvisando à medida e exagerando à vontade. Anderson deixa-os criar o seu espaço, limitando-se a gravar as suas representações como um espectador maravilhado, sem grandes movimentos de câmara, como alguém que não consegue tirar o olhar de cima. Depois, nos momentos certos, tal como numa cena em que Freddie e Dodd conduzem uma moto no deserto, abre-se em grandes e irrepreensíveis planos, metódicos, que abrem espaço à reflexão do espectador. 

O Mentor, pautado por admiráveis momentos, e por uma banda sonora frenética, é, sobretudo, a história de uma jornada de auto-descoberta, de cura e de libertação, mesmo que eventualmente nenhuma das três se concretize plenamente ou da forma esperada. Possivelmente, é igualmente uma censura à Cientologia, mas tal perde importância quando são valores e expectativas humanas que alicerçam o argumento. O Mentor encontra-se nomeado para três Óscares® pelos desempenhos de Phoenix, Hoffman e Adams. 

CLASSIFICAÇÃO: 4 em 5 estrelas


Trailer:

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