A intenção de Hitchcock é a de homenagear o trabalho do realizador britânico e a produção
de um dos seus mais famosos – se não o mais marcante de todos eles – filmes. Embora
triunfe satisfatoriamente nesse aspecto, alicerçado numa actuação maravilhosa de
Anthony Hopkins, erra absolutamente na sua injustificada ambição de dramatizar
o desnecessário.
Alfred Hitchcock (Anthony Hopkins) é um
conceituado realizador que se encontra sem um novo projecto e que se sente
ameaçado com o cenário de fim de carreira. Assombrado por alguns projectos
televisivos de pouco sucesso, sente a necessidade de um projecto arrojado que
volte a colocar o seu nome na ribalta. Alfred encontra um livro baseado num
assassino em série e decide adaptá-lo, contra a vontade da sua mulher Alma
(Helen Mirren). A sua determinação levá-lo-á a concretizar um dos mais
conceituados filmes de sempre: Psico.
Psico é, discutivelmente, o maior
sucesso do britânico Alfred Hitchcock. É certamente o seu maior sucesso de
bilheteira e uma incontornável obra-prima do suspense que redefiniu os limites
do horror e introduziu um novo nível concebível de ansiedade e aflição no
espectador. Mas a rodagem de Psico
não foi natural. Negada por várias produtoras, o realizador foi forçado a efectuar
um investimento próprio, encarado pela indústria como de risco e irreparável. Alfred
Hitchcock levou a sua ideia, o seu turbilhão criador, avante e o resultado é um
dos filmes mais conceituados da história do cinema. Adaptado do livro Alfred Hitchcock and the Making of Psycho,
de Stephen Rebello, Hitchcock
propõe-se a recriar a teimosia, a inspiração e o método do aclamado realizador.
Até certo ponto, Hitchcock consegue
cumprir satisfatoriamente o seu propósito, mas, ao contrário da obra do homem
que lhe serve de fundação, sacia-se apenas com o fazer bem, sem pretensões de excelsas
características, não fugindo, ou evitando a importância, de convencionalismos
dramáticos.
Os
convencionalismos rodeiam quase sempre Alma e a sua relação com o argumentista
Whitfield Cook. Hitchcock pretende
estabelecer uma dicotomia sucesso-insucesso da filmografia de Alfred apoiada na
qualidade da relação com a Alma: quando a rodagem de Psico se encontra encalhada e designada ao fracasso, a relação de
Alfred com Alma encontra-se tensa e ameaçada, e vice-versa. Mas que Hitchcock dê demasiada importância ao mexerico
que constitui a relação de trabalho entre Alma e Whitfield constitui um
rudimentar mecanismo para o verdadeiro propósito desta dramatização: aliar Alma
a todo o êxito do britânico. Desnecessário, pois a autoridade de Alma nos
projectos do realizador foi desde sempre reconhecida e partilhada por ele
próprio.
Hitchcock prende finalmente a atenção quando
concentra os seus esforços na essência da sua premissa: a rodagem de Psico. Hitchcock corria o risco de funcionar como um rotinizado olhar
documental aos bastidores, e não evita alguns automatismos, mas desperta interesse
no seu recontar de eventos, envolvendo Alfred numa maré de desafios – de
produção, de aprovação, de sedução, de obsessão – que vão introduzindo novas dinâmicas
ao longo do enredo e vão colocando questões inesperadas sobre as capacidades –
e até a sanidade – do britânico. Anthony Hopkins desaparece no ecrã, encarando
notavelmente o seu compatriota, reproduzindo os seus maneirismos, a sua voz e a
sua forma despretensiosa de estar com classe.
Talvez por não
ter um estilo próprio – é a sua primeira longa-metragem (não considerando o
documentário Anvil: The Story of Anvil)
–, ou em homenagem a Alfred Hitchcock, ou talvez ambos, Sacha Gervasi procura
reproduzir ao longo do filme muitas das então inovadoras técnicas do britânico.
Designadamente, tenta introduzir alguma categoria de suspense no argumento
escrito por John J. McLaughlin, com planos súbitos, luzes reduzidas e edições
frenéticas. É particularmente evidente quando recria a filmagem da famosa cena
do chuveiro de Psico, mas noutras
também, embora nem sempre com sucesso ou competência.
No fim de
contas, Hitchcock consegue tornar
mais pessoal o trabalho e a envolvência de Alfred em Psico, estabelecendo uma motivação – para a necessidade de filmar –
aliada à idade e à concepção do fim da carreira. Falha em quase todos os
aspectos que escapam à temática de Psico,
mas consegue pelo menos glorificar o trabalho do mestre do suspense e mostrar,
com uma certa dose de humor, as relações nos estúdios de Hollywood e os pequenos
tabus instalados. Basta, satisfaz, mas apenas isso.
CLASSIFICAÇÃO: 3 em 5 estrelas
Site Oficial: http://www.hitchcockthemovie.com/
Trailer:
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